sexta-feira, 24 de novembro de 2006

Bonnie and Clyde, Hank and Sarah...

15 Agosto 2005Ela parou o carro no estacionamento, pegou o celular, ligou:
Ela: Cadê você?
Ele: Cadê VOCÊ que não ta aqui?
Ela: to no estacionamento.
Ele: Qual?
Ela: ai...to no lugar errado?
Ele: Ta. Pêra que eu to indo aí.
E lá vem ele...camiseta vermelha de novo...tirando o cabelo do rosto...rindo. Entra no carro, diz o nome que ela odeia, mas ele pode.
Ela: Pra onde a gente vai?
Ele: Pra casa do lago.
Ela: Você conhece lá?
Ele: Profundamente. Já estive lá uma vez, num dia frio, tomando vinho.
Ela: não me lembro...
Ele: nem eu...
O carro anda sozinho. É sempre assim quando eles estão juntos. Parece que tudo anda sozinho, menos o tempo que pára.
Ela encosta o carro. "Porque você não dirige?" Ele assume o volante. Ela adora. Na verdade, por dentro eles tem a mesma idade sem ter, mas em algumas coisas ele parece mais velho. Ela se sente segura quando ele dirige, quando ele fala, quando ele decide. Não é comum para ela confiar em alguém. Sempre na frente, sempre a cabeça de tudo, sempre cuidando dos outros, nunca sendo cuidada.
Ele é mandão e atencioso. Ela acha graça de quando ele dá ordens. Mas as acata, porque adora. Ele pede atenção todo o tempo. Quer ser olhado nos olhos, quer os ouvidos todos, quer seus cuidados, e os tem.
Ele acende um cigarro. Ela sorri.
Ele: O que foi?
Ela: Odeio que fumem no meu carro.
Ele: Ah ta...
E continua fumando.
E porque não briga? Porque não reclama? Porque não tem um ataque e tira o cigarro dele?
Simples...Porque não precisa. O que existe ali faz com que qualquer capricho se reduza a nada. Porque reclamar do cigarro que é fruto do encontro dos dois? Ele nem fuma! Mas está com ela, e quando isso acontece eles ficam iguais. Ela nem bebe, mas quando está com ele acompanha cada gole, cada trago, de igual pra igual.
Chegam à casa na beira do lago.
A tarde está linda, o vento quente, o lago calmo. Ela entra, larga a bolsa no sofá, liga o som: "Clavo mi remo en el água...Llevo tu remo en el mío...Creo que he visto una luz al otro lado del rio."
"Quer vinho?" Claro que quer! Eles sempre querem beber e falar e fumar e falar mais. O que seria se tivesse mais gente ali? Os dois falariam um com o outro como se ninguém estivesse ouvindo. Não existe mais ninguém. Nunca.
As garrafas se esvaem em palavras e as palavras são o que os dois têm de mais forte e sólido. Olhares e palavras. E desafiam um ao outro todo o tempo. Divertem-se com coisas que seriam um tédio para qualquer um. São jogos idiotas que sempre acabam em textos que fazem rir aos dois, que amam as palavras mais do que ao sol lá fora.
Se conhecem tão profundamente que dizem as mesmas coisas, ao mesmo tempo, riem de tudo antes de dizer, gostam do que ouvem, amam o que pensam porque disso é feita a vida que criaram. Particular. Única.
Partners in crime: Bonnie and Clyde, Hank and Sarah, Jean Paul e Simone. Dupla perfeita, the fab two.
E como seria perfeito se fosse de outro jeito...Bonnie e Clyde, Hank e Sarah, Jean Paul e Simone dividiam a cama, a mesa, o banheiro. Esta dupla divide as letras, e eventualmente a casa do lago, num sonho alucinado de um deles, quando consegue dormir.
Ele: O que eu faço com a chave do carro?
Ela solta uma gargalhada e não responde...
Ela sente saudade do que não há. Rainha do impossível...Rainha das palavras vagas. Ele anseia pela vida plena de amores, garrafas e histórias. Rei das palavras certeiras.
Vista de fora, a casa do lago é cheia de vida: Cabeças passando pela janela, gestos largos, gargalhadas. A luz fraca das velas projeta sombras nas paredes. A música alta, as janelas abertas, a cozinha acesa...
Aos poucos, grilos e sapos se fazem ouvir. As janelas se fecham, as vozes desaparecem...Quem há de saber onde foram guardadas as palavras? Não eu.
A casa do lago abriga esta noite uma história forte, viva, rica, repleta de alegria, olhares e sorrisos. Mas suas páginas são ainda um mistério.
Bonnie and Clyde, Hank and Sarah, Jean Paul e Simone...dormem.

Bom dia, flores do meu dia...

4 comentários:

Anônimo disse...

Ainda estou completamente envolvida...que posso dizer...um remédio para a alma esse texto...suave!!!!!
Beijos!!!

Marilia Lopes 15.08.2005

Anônimo disse...

Adoro o jeito como voce escreve! fan de carteirinha. Voce leva todo mundo pro lago, pra beber conversar e sorrir... ;)

Thiagota0 17.08.2005

Anônimo disse...

Não sei pq... fico arrepiada lendo o que vc escreve...talvez seja até um pouco de inveja. Inveja boa (se é que isto existe) ou outra coisa, sei lá que eu não sei definir ...Bem, mais a "ïnveja"é da história...acho que eu gostaria que as minhas fossem assim tbm..tão fortes que parecem reais.

Beijinho

Cris Esteves 18.08.2005

Anônimo disse...

Mê, eu também fico pasma com seus textos, realmente parece tudo muito real...as vezes chego a ver a cena... é incrível.

Ja te disse que adoro ler isso aqui.
Super beijoca

Livinha 18.08.2005