24 Setembro 2005
Meu pai ligou as nove da manhã.
A voz forte e segura de sempre, me tirou de um médio torpor de quem já acordou mas ainda não conectou os neurônios.
"Eu me lembro como se fosse hoje do dia que você nasceu...".
E foi me contando cada detalhe do parto que ele assistiu, como os outros três. Falou que eu tinha cabelo para fazer uma trança e que seu amigo foi me ver no berçário e disse que eu parecia uma criança de três meses. "Você estava na barriga da sua mãe com a mão na testa, como se já estivesse pensando."
Com sua voz de pai que conta histórias na beira da cama, ele me fez chorar com seu carinho. A voz sorridente de sempre. A voz que com qualquer palavra acaba por dizer "Calma... eu estou aqui".Porto seguro de nós todos. Chão da nossa casa. Âncora de nossas vidas.
Eu chorei. Pelo ano que passou. Por ele ainda estar lá. Por saber que tenho a felicidade da sua voz.
Hoje faz 44 anos que ele viu aquela galega cabeluda nascer. Faz menos tempo que ele me pegava pela mão e levava com ele a um bar na lagoa Rodrigo de Freitas para comer ostras. Faz menos que ele me guiou pelo corpo da Igreja. Faz menos que seus cabelos ficaram prateados. E sua voz ainda me traz o mesmo sossego.
Hoje faço 44 anos. Metade da minha vida talvez.
Aprendi com meus pais a não ter medo. A começar de novo. A olhar pela janela e sonhar. A sentar à mesa e olhar nos olhos de quem eu amo para ouvir como foi seu dia. Aprendi a querer saber. Aprendi a comer doce de leite lambendo a colher, pipoca lambendo os dedos, tomar água escondido na garrafa, dar risada. Aprendi com eles que reunião de família é engraçado. É hora de comer coisa boa, contar histórias e rir muito. Aprendi a abraçar. A cobrir meus filhos quando vou dormir. A beijá-los sempre ao chegar e ao sair, mesmo que isso aconteça vinte vezes no mesmo dia. Aprendi que o cheiro de café quer dizer "estamos juntos". Que domingo é dia de salada grande e roupa boa. Que pra estar junto não é preciso estar perto.
Aprendi a viver e a ser feliz com essas pessoas que nunca deixaram que o dinheiro parecesse importante, mesmo quando ele existia (o que era raro). Aprendi que você é o que você sabe e não o que você tem. Mas penteie o cabelo, suba no salto, levante os ombros, olhe nos olhos, aperte a mão com força, encha a boca para dizer seu nome. A dignidade e a elegância vêm de dentro. Não é preciso arrastar um par de chinelos para limpar a sua casa. Não é preciso vestir roupas rasgadas para lavar sua roupa no tanque. Não é preciso estar feia para lavar o seu banheiro. Luvas e um sorriso no rosto. O mesmo sorriso para o servente e o presidente. A mesma humildade para o gênio e o porteiro. Escutar mais do que falar, mas falar firme e em bom som.
Com eles aprendi a me relacionar e a sorrir. Vi que o tempo deixa marcas mas não leva a juventude. Vi que a velhice tira a pressa, mas não a vontade de viver.
Com a voz segura e a dignidade do meu pai e os fortíssimos alicerces da minha mãe aprendi a viver. Aos 44 anos me pego vivendo melhor do que aos 20, e com certezas maiores. Descobri que eles me prepararam para viver a longo prazo.
Hoje, faz 44 anos que meu pai me viu nascer. Eu lutava pela vida naquele momento como o vejo lutando agora. Tenho ainda a mão na cabeça, como se tudo o que tivesse a fazer na vida fosse pensar. Tenho ainda a voz tranqüila do meu pai em meus ouvidos.
Pouca coisa mudou neste furacão de mudanças que sou eu.
Meu pai ligou as nove da manhã.
A voz forte e segura de sempre, me tirou de um médio torpor de quem já acordou mas ainda não conectou os neurônios.
"Eu me lembro como se fosse hoje do dia que você nasceu...".
E foi me contando cada detalhe do parto que ele assistiu, como os outros três. Falou que eu tinha cabelo para fazer uma trança e que seu amigo foi me ver no berçário e disse que eu parecia uma criança de três meses. "Você estava na barriga da sua mãe com a mão na testa, como se já estivesse pensando."
Com sua voz de pai que conta histórias na beira da cama, ele me fez chorar com seu carinho. A voz sorridente de sempre. A voz que com qualquer palavra acaba por dizer "Calma... eu estou aqui".Porto seguro de nós todos. Chão da nossa casa. Âncora de nossas vidas.
Eu chorei. Pelo ano que passou. Por ele ainda estar lá. Por saber que tenho a felicidade da sua voz.
Hoje faz 44 anos que ele viu aquela galega cabeluda nascer. Faz menos tempo que ele me pegava pela mão e levava com ele a um bar na lagoa Rodrigo de Freitas para comer ostras. Faz menos que ele me guiou pelo corpo da Igreja. Faz menos que seus cabelos ficaram prateados. E sua voz ainda me traz o mesmo sossego.
Hoje faço 44 anos. Metade da minha vida talvez.
Aprendi com meus pais a não ter medo. A começar de novo. A olhar pela janela e sonhar. A sentar à mesa e olhar nos olhos de quem eu amo para ouvir como foi seu dia. Aprendi a querer saber. Aprendi a comer doce de leite lambendo a colher, pipoca lambendo os dedos, tomar água escondido na garrafa, dar risada. Aprendi com eles que reunião de família é engraçado. É hora de comer coisa boa, contar histórias e rir muito. Aprendi a abraçar. A cobrir meus filhos quando vou dormir. A beijá-los sempre ao chegar e ao sair, mesmo que isso aconteça vinte vezes no mesmo dia. Aprendi que o cheiro de café quer dizer "estamos juntos". Que domingo é dia de salada grande e roupa boa. Que pra estar junto não é preciso estar perto.
Aprendi a viver e a ser feliz com essas pessoas que nunca deixaram que o dinheiro parecesse importante, mesmo quando ele existia (o que era raro). Aprendi que você é o que você sabe e não o que você tem. Mas penteie o cabelo, suba no salto, levante os ombros, olhe nos olhos, aperte a mão com força, encha a boca para dizer seu nome. A dignidade e a elegância vêm de dentro. Não é preciso arrastar um par de chinelos para limpar a sua casa. Não é preciso vestir roupas rasgadas para lavar sua roupa no tanque. Não é preciso estar feia para lavar o seu banheiro. Luvas e um sorriso no rosto. O mesmo sorriso para o servente e o presidente. A mesma humildade para o gênio e o porteiro. Escutar mais do que falar, mas falar firme e em bom som.
Com eles aprendi a me relacionar e a sorrir. Vi que o tempo deixa marcas mas não leva a juventude. Vi que a velhice tira a pressa, mas não a vontade de viver.
Com a voz segura e a dignidade do meu pai e os fortíssimos alicerces da minha mãe aprendi a viver. Aos 44 anos me pego vivendo melhor do que aos 20, e com certezas maiores. Descobri que eles me prepararam para viver a longo prazo.
Hoje, faz 44 anos que meu pai me viu nascer. Eu lutava pela vida naquele momento como o vejo lutando agora. Tenho ainda a mão na cabeça, como se tudo o que tivesse a fazer na vida fosse pensar. Tenho ainda a voz tranqüila do meu pai em meus ouvidos.
Pouca coisa mudou neste furacão de mudanças que sou eu.
15 comentários:
Então tenho que agradecer aos seus pais por voce né!!!
Hoje especificamente...sensibilidade á flor da pele...nervos agitados...neurônios em greve...hahahahahahaha
Mas...foi como se ouvisse a voz tranquila...estou emocionada!!!
PARABÉNS!!!(pela terceira vez)hahahahaha
Beijos!!!!
Marilia Lopes 15.09.2005
Hoje eu tenho metade do seu tempo de voz, mas também coloco a mão na cabeça e pensou em todos os furacões!
lindo o texto!
Tito Iubel 25.09.2005
Queria hoje, aos 20, ter a tranquilidade e a paciência q só o tempo trás... vejo em vc um exemplo...obrigada por algumas importantes lições na minha vida... Algumas vidas de seus textos, outras tantas da amizade do seu filho!:D
Bjos Tia!
Anne 25.09.2005
Justiça foi feita.
O texto me deixou com os olhos cheios d'água. Não teria como enganar.
Beijos ! E Parabéns !
Rodrigo Gameiro 25.09.2005
Então Parabéns, mais uma vez!
Pelo seu texto lindo, pela sua família maravilhosa, pelo seu aniversário!
bjs, muitos bjs
Rafaela Pedro 26.09.2005
Vc me parece, se parece.......
Leia, se ainda não leu:
Profecias de Nostradamus e de outros videntes, - Marques da Cruz.
"O homem é barro. Um pote de barro, vertical, resfolegante, com muita água suja. O dever do homem é ir despejando, constantemente, no seu pote, a água limpa da virtude, até que saia toda a água suja, e fique só a limpa.
O seu "corpo" não deve ser "porco".
A sua "alma" não deve ser "lama"
(as mesmas letras)...
Depois de uma lágrima salgada e quente, os olhos do corpo e da alma vêem melhor. A lágrima é um colírio divino.
Depois de trovões, raios e chuva, a terra fica mais salitrada e produz mais.
Da semente, só depois de apodrecida na terra, é que sai a planta. Da terra bem estrumada sai melhor planta, flor e fruto.......
Vc vai amar.Tem sua cara.
Spy 26.09.2006
Parabéns Mercedes, que muitos outros quatros e quatros possam vir...
Lindo D+ o texto. T
hyagota0 26.09.2005
Minha querida amiga. Tô emocionado de novo contigo. O texto é lindo e vc tá inteira nele , as usual. Sabe, é um privilégio ter o pai "porto seguro" por perto. Eu tbém queria, sinto falta desta figura maravilhosa que foi meu pai. Me emocionei com teu texto tbém por isso, lembrei do meu pai. Beijo meu amor.
Edson Perin 27.09.2005
Continuo seu fã. Meio desaparecido, porém sempre presente. Beijo
Gil 27.09.2005
Mercedes...
Parabéns pelos 44 anos... Parabéns por escrever tbem neste momento...
Lindo...lindo...lindo...me emocionou mesmo sem conhecer seu pai.
um grande abraço
Ro(Panamericana)
Rosana Ikeda 27.09.2005
Parabéns pelo seu niver (Antes tarde do q nunca... q clichê!!!!)e claro parabéns pelos belos textos!!!!!
Sucesso!!!!
Bjs
Carol 29.09.2005
Lendo atrasado, aos poucos, mas lendo!
Que texto bonito, Mercedes. Sou mais
um número na estatística dos chorões
Rodrigo Batista 29.09.2005
Oi Met, mais uma vez vc traduz muito bem momentos e situações da nossa vida. Descreve as pessoas que a gente ama com uma propriedade incrível. O texto esta maravilhoso e o meu escritório alagado.
Beijos...Te amo. Fique com Deus.
Patrícia Zanicotti 09.10.2005
Mercedes adorei por demais seu texto, me lembrou meu pai tbem, tivemos uma infancia parecida rodeada de amor e muitos cuidados, como foi bom , como é bom recordar estes momentos..Parabens querida..
www.n.moises.blog.uol.com.br
Nancy Moisés 17.11.2005
Emocionante! Congratulations.Faltava um texto assim pra me tornar seu fã.
Sabe, as palavras limitam o pensamento. Menos o seu é claro, pois voce as utiliza muito bem, com muita personalidade, sensibilidade...
Meus parabéns! Se não pelo niver, pelo menos por esse texto lindo.
Grande abraço!
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